Espécie emblemática e reconhecida como maior felino das Américas, desenvolve um papel fundamental nas florestas, e por séculos tem sido cultuada como símbolo de força por inúmeros povos indígenas na América do Sul.
A onça-pintada é um animal de topo da cadeia alimentar, ou seja, que controla populações de outras espécies e, com isso, sustenta um delicado equilíbrio entre fauna e flora. Sua presença é um importante bioindicador da qualidade de um ambiente natural.
Estima-se que as áreas habitadas pelos felinos, globalmente, fornecem 12% da captura de CO², 10,5% da produção de madeira e 9,8% da pesca comercial. Mas, infelizmente, os cientistas calculam que nas últimas décadas a espécie tenha perdido 50% de sua distribuição histórica. Apenas 8,6% da superfície terrestre do planeta hoje possui populações de onça-pintada.
Essa mesma área é lar de 28% de toda biodiversidade global. Considerada como “quase ameaçada” na Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), existem apenas 174.000 espécimes na natureza, 2/3 na Amazônia.
Dentre as ameaças ao animal, o desmatamento, seja pela expansão da agricultura e da pecuária industrial, a expansão da área urbana, a extração ilegal de madeira, o desenvolvimento de projetos de infraestrutura, a degradação e perda de seus habitats, a caça ilegal e o tráfico internacional.
Assim, com o objetivo de garantir a recuperação da onça-pintada, foi criada a Estratégia de Conservação da Onça-Pintada 2020-2030, um programa que contempla 15 paisagens prioritárias, em 14 dos 18 países onde o felino ainda vive, inclusive no Brasil.
Coordenada pela Rede WWF em parceria com outras organizações, a Estratégia irá promover atividades econômicas sustentáveis, como agrofloresta e restauração florestal comunitária, em benefício das populações humanas que coexistem com o felino.
“A onça-pintada pode se tornar um símbolo de desenvolvimento sustentável na América Latina, e os esforços dirigidos a sua conservação podem ajudar os países a cumprir suas metas de desenvolvimento sustentável”, disse Maria José Villanueva, Diretora de Conservação do WWF-México e líder regional da iniciativa de conservação da onça-pintada.
A estratégia, que tem duração de 10 anos, será um guia para as ações do WWF na região a favor do maior felino do continente e das áreas que ele habita. A ideia é assegurar as Unidades de Conservação da Onça-Pintada, áreas de prioridade para a proteção da espécie. Das 15 paisagens prioritárias identificadas pelos cientistas ao longo de 20 anos, sete são transfronteiriças, sendo que uma delas é o Pantanal.
“A Estratégia delineia as duas metas que a Rede WWF planeja alcançar para 2030: estabilizar ou aumentar as populações de onça-pintada e aumentar ou estabilizar a distribuição do felino, as populações de suas presas e a conectividade de seus habitats dentro das 15 paisagens prioritários”, explica Roberto Troya, Diretor Regional do WWF na América Latina e Caribe.
A Estratégia de Conservação da Onça-Pintada 2020-2030 está sendo lançada quando a conexão entre a nossa saúde e a da natureza está mais evidente que nunca. Hoje sabemos que a perda de biodiversidade está ligada à aparição de vírus como o SARS-CoV-2, que causa o COVID-19. “Ao conservar a onça-pintada e seu habitat, o WWF contribui em reverter a perda de espécies e em diminuir a probabilidade de surgirem novas enfermidades de origem animal”, disse Troya.
O documento também delineia as contribuições do WWF a outros esforços internacionais de conservação, como o Plano Onça-pintada 2030, lançado na CoP-14 de Diversidade Biológica, em 2018. Entre as contribuições, destacam-se o fortalecimento da cooperação transfronteiriça, o impulsionamento de modelos de desenvolvimento sustentável compatíveis com a conservação da onça-pintada nas paisagens prioritárias e melhorar a sustentabilidade financeira das ações dirigidas à conservação da onça-pintada e de seu habitat.
Atuação do WWF-Brasil
Ao longo da história do WWF-Brasil, já desenvolvemos projetos pela conservação da onça-pintada em alguns biomas brasileiros e nas regiões compartilhadas com outros países da América do Sul.
Marcelo Oliveira, especialista em conservação do WWF-Brasil, explica que na Amazônia as ações priorizam a geração de conhecimento científico. “Assim temos melhor entendimento sobre o estado de conservação das populações desse felino nas áreas protegidas, incluindo os territórios indígenas, que são refúgios importantíssimos para manutenção da maior população de onças-pintadas do mundo”, comenta.
Já na Mata Atlântica, um exemplo de atuação do WWF-Brasil é o projeto de conservação de onças-pintadas no corredor trinacional, em parceira com Argentina e Paraguai. Dentro desta cooperação, pesquisadores brasileiros e argentinos realizam juntos desde 2015 o censo populacional de onças-pintadas (Parque Nacional do Iguaçu, Brasil, e Corredor Verde, Argentina).
O último censo, divulgado em novembro de 2019, apontou crescimento do número de onças-pintadas na região. O total estimado passou de 71 a 107, em 2016, para entre 84 e 125 no ano passado. Foram 217 pontos de amostragem, 600 mil hectares amostrados e mais de 10 mil km percorridos pelas equipes dos dois países. De carro, a pé, de barco e helicóptero, armadilhas fotográficas foram instaladas para que a densidade das onças-pintadas pudesse ser amostrada.
Felipe Feliciani, analista de conservação do WWF-Brasil, explica que, no Brasil, os trabalhos são focados no Parque Nacional do Iguaçu (PR) e no Parque Estadual do Turvo (RS). “Os resultados obtidos nos últimos anos são animadores e demonstram que os esforços de conservação estão surtindo efeito. A população de onças-pintadas no Parque Nacional do Iguaçu, por exemplo, é a única na Mata Atlântica, que comprovadamente está em uma curva crescente”, comenta.
Um novo censo deveria ter sido feito no primeiro semestre de 2020, mas foi adiado por conta da pandemia de Covid-19. Ainda assim, o projeto Onças do Iguaçu e outros parceiros locais continuam atuando na região pela conservação das onças. “A Estratégia regional para a conservação de onças-pintadas vai fortalecer ainda mais esse trabalho conjunto entre países vizinhos, além de promover de forma mais intensa a troca de experiências entre os diversos projetos que atuam em todo o território de ocorrência da espécie”, reflete Felipe Feliciani.